Uma empresa financia seus ativos e sua operação através de uma combinação de capital próprio e capital de terceiros. A proporção do uso destas fontes é chamada de estrutura de capital.
NAVEGAR É PRECISO
Desde uma simples linha de capital de giro, passando por adiantamento de recebíveis, emissão de debêntures, financiamento mezanino ou linhas para investimentos, até a emissão de ações na bolsa de valores, cada opção tem um nível de risco e uma expectativa de retorno para quem fornece os recursos, que em contrapartida corresponde ao custo para o tomador.
O endividamento da empresa nem sempre é ruim. Usado de forma prudente, pode aumentar o retorno sobre o patrimônio líquido – o retorno que os sócios recebem pela sua parte da equação de financiamento – porque o endividamento é, em mercados maduros e condições normais, uma forma mais barata de financiamento do que o dinheiro fornecido pelos acionistas.
CARTAS NÁUTICAS
Diversos estudos já foram realizados buscando entender a dinâmica das estruturas de capital. Durand (1952), defendia a existência de uma estrutura de capital ótima, já Modigliani e Miller (1958) afirmavam que a estrutura de capital seria irrelevante para a maximização do valor das empresas. Na evolução, duas abordagens destacam-se. A primeira é a do Trade-off (1973 e 1984), segundo a qual as empresas escolheriam uma estrutura de capital capaz de balancear os custos (risco de falência) e os benefícios (redução do imposto de renda e do custo de capital) decorrentes da utilização de dívidas. A outra abordagem é a Pecking Order (1984), que indica a existência de uma ordem de prioridade entre as várias fontes possíveis. A preferência inicial seria o autofinanciamento, através de lucros retidos. Esgotada esta fonte, recorre-se ao endividamento e por último ao aumento de capital.
Com tantas variáveis, é natural que cada setor e empresa tenham diferentes estruturas de capital, mas dados agregados da economia americana trazem uma estabilidade no mínimo intrigante. Exceto pelo período dos anos 70 e 80, onde houve uma grande onda de aquisições alavancadas, o grau de endividamento das empresas, em nível agregado, ficou sempre ao redor dos 32%.
INSTRUMENTOS DE NAVEGAÇÃO
Existem vários indicadores utilizados para medir o grau de endividamento e o nível de risco das empresas. Três deles são os mais usados para determinar a saúde geral da estrutura de capital. Indicamos também alguns parâmetros gerais, que obviamente em cada empresa devem ser analisados dentro de seu contexto, em conjunto com outros indicadores.
RUMO AO CABO DAS TORMENTAS
Na nossa realidade brasileira, as idiossincrasias da economia desafiam boa parte do referencial teórico e das tendências de equilíbrio. Taxas de juros exorbitantes, alta intervenção governamental na economia, o quase monopólio de financiamentos de longo prazo (leia-se BNDES), um mercado de capitais pouco desenvolvido e um ambiente econômico extremamente volátil são alguns dos elementos que criaram nestes últimos anos um cenário sem precedentes no endividamento das empresas.
O processo de endividamento crescente a partir de 2010 levou um conjunto relevante de grandes empresas a uma situação dramática: a geração de caixa dessas companhias não está cobrindo sequer as despesas financeiras. Esse é o resultado de uma combinação perversa da recessão com a desvalorização da taxa de câmbio, juros elevados e queda das vendas. A constatação é de um recente trabalho feito pelo Cemec (Centro de Estudos do Instituto Ibmec), envolvendo 605 empresas não financeiras, sendo 256 de capital aberto e 349 fechadas. Como consequência óbvia, em 2015 e 2016 explodiram o número de Recuperações Judiciais e reestruturações de dívidas.
DOBRANDO O CABO DAS TORMENTAS
A boa notícia é que aparentemente já dobramos o Cabo das Tormentas, e a tendência é de um cenário melhor nos próximos meses e anos. Segundo dados do Banco Central, o estoque da dívida privada e o nível de inadimplência das empresas já iniciou uma reversão
na tendência. Com a estabilidade do câmbio e a tendência de queda da inflação e das taxas de juros, as empresas (que sobreviverem) deverão recuperar lentamente seus níveis normais de rentabilidade e endividamento.
AVISO AOS NAVEGANTES
Embora seja saudável e até recomendável as empresas carregarem algum nível de endividamento, é importante estarem atentas aos principais fatores que influenciam o risco e a capacidade de endividamento.
Assim, as empresas, especialmente as pequenas e médias, devem buscar seu crescimento sendo prudentes em termos de estrutura de capital. Dentro da desafiante realidade brasileira, fazer parcerias e associações com players estratégicos ou financeiros mais robustos pode ser a maneira mais rápida e segura de navegar sem o risco de naufrágio.